FUTEBOL: HOMENAGEM A GUILHERME VASCONCELOS MENDES



Amigos,

A rodada de hoje – 16.06 – e que iria definir o campeão do 1º Turno do nosso 13º Campeonato de Mini-futebol não se realizou. Em virtude do falecimento de Guilherme Vasconcelos Mendes, servidor da Justiça Federal, e que inúmeras vezes desfilou seu talento no nosso campo, decidimos adiar a partida que seria entre a própria Justiça Federal e o Tribunal de Justiça.

A ASTRA 21, em nome de todas as equipes que participam do 13º Campeonato, se solidariza com os familiares de Guilherme e com seus colegas de trabalho, em especial os que fazem parte do time de futebol da JFRN.

Guilherme era meu amigo pessoal. Fomos colegas na mesma escola. Jogamos nos mesmos times entre 1977 e 1983. Daqueles amigos feitos na infância e onde não há interesses. Chegamos a ser vizinhos por um tempo. Nos encontramos depois em times opostos, eu pelo TRT, ele pela JFRN. Deu muito trabalho aos nossos times quando tínhamos as acaloradas pelejas entre as duas justiças. Marcá-lo? Era impossível!

A notícia da recidiva de sua enfermidade pegou todos de surpresa. Ele não chegou a ver seu time disputar a final.

Se não houve jogo, resenha era para não ter. Mas por respeito a ele, que foi um “senhor dos gramados”, um “ás com a bola nos pés”, e que tanto desfilou sua categoria em nosso campo da ASTRA, decidi abrir o espaço para homenageá-lo. Não somente como amigo que fui, mas me atrevendo a falar por todos os que participam do nosso campeonato: JURIS, SEA, PRIORI, BARÇA, NEWS REAL NATAL, OAB e TRIBUNAL DE JUSTIÇA. É como se os atletas tenham me outorgado o direito e assinado procuração para que eu fale em nome de todos, pois o futebol jogado na ASTRA tem essa característica maior, FAZER AMIGOS.

Nossa homenagem a Guilherme Vasconcelos Mendes.

 

“Hoje outros craques repetem as suas jogadas,
Ainda na rede balança seu último gol,
Mas pela vida impedido parou,
E para sempre o jogo acabou,
Suas pernas cansadas correram pro nada,
E o time do tempo ganhou”.

1977. Chega outubro, o mês mais esperado do ano. Até mesmo do que o das férias. Tudo por conta das Olimpíadas Infantis. Passávamos o ano inteiro esperando por aquela semana do esporte. A 5ª Série era a mais velha do período vespertino e essa foi a nossa última olimpíada infantil. A partir da 6ª Série jogaríamos a Champagnat, um nível acima, com os maiores.

As séries foram distribuídas com nomes de países. Minha turma – 5ª “E” – seria a Inglaterra. Coube a mim a camisa 07, que na época era usada por Kevin Keegan, um craque que fez história na seleção britânica.

Mas o craque mesmo naquela olimpíada infantil foi um magrelo, esguio, que no alto dos seus 11/12 anos já demonstrava para todos o que era jogar futebol. Sua habilidade com a bola aliada ao biótipo físico se impunha frente os demais garotos, quase todos franzinos e pequenos. Os maiores – como chamávamos os reprovados -, nem eles eram páreo para Guilherme, esse o nome do menino que chegara novato no colégio para encantar quem o via jogar.

Porém, o garoto já ali começava a apresentar sua outra característica marcante. Era introvertido, resguardado, tímido em excesso. Foi assim, sempre. A alegria com que jogava bola era inversamente proporcional ao seu acanhamento. Parecia que tinha vergonha até mesmo de comemorar seus tantos gols a cada jogo.

A magreza, o tamanho que o obrigava a andar envergado para frente, a tez morena, sugeriram o apelido que veio também em harmonia com a primeira sílaba de seu sobrenome. Guilherme Vasconcelos virou Guilherme “Vareta”, alcunha infanto-juvenil que carregou para sempre.

O futebol de salão lapidou o garoto. O ginásio do Maristão passou a ser o salão onde ele brincava o seu carnaval, dando um baile nos adversários, sem máscaras, com aquele rosto sério partindo com a bolada colada nos pés em direção ao gol oposto como que cantasse “ô abre alas que eu quero passar”.   Era um mestre-sala que contribuía para a evolução do time e incendiava a bateria da torcida. A nota 10 ao fim do jogo era o enredo que se sabia antes mesmo de entrar em campo.

E assim passou o tempo. Tantas outras olimpíadas, depois representando o Marista em jogos escolares estaduais e regionais. Nosso time era perfeito, apesar da sorte nos dar as costas nos momentos de decisão.

O introvertido Guilherme somente com poucos amigos se mostrava mais relaxado. Era no “Alvorada”, um grupo de jovens sob a liderança do Ir. Milson, nos encontros de formação na casa dos Irmãos em Ponta Negra. Ali ele virava moleque.

Ao sair do colégio manteve-se a desfilar seu futebol habilidoso no time de Engenharia Civil da UFRN, num outro time imbatível que também fez história nos Jogos Universitários nos anos 80.

Sua auto-clausura então recomeçou. Já não podíamos contar com ele. Os eventos sociais quase nunca tinham a sua presença. Dividia-se entre o futebol – o América e o Flamengo - e a música, outra de suas paixões. Comprava LP’s, CD’s, DVD’s, revistas sobre músicas, colava notícias em cadernos específicos das bandas e de cantore(a)s de sua preferência.

Da universidade seguiu para a Justiça Federal, onde foi aprovado em concurso público. Lá fez outros amigos, passou a ser tão admirado quanto em nosso colégio, mas não mudou sua forma de agir. Com alguns mais próximos colegas de trabalho revelou-se aquele mesmo molecão que só nós, do Grupo Alvorada, conhecíamos.

Como alguém tão intimista podia atrair tanto bem-querer?  

Então o destino, como um zagueiro viril que segue impiedosamente o craque-artilheiro, se pôs a sua frente para interromper uma trajetória vitoriosa e feliz. Guilherme usou ainda sua habilidade, sua ginga, driblou o destino uma vez, e com a ajuda de um exército de amigos e  de times adversários que se uniram para pedir a Deus pela sua vitória pessoal, seguiu em frente, elegantemente, certo de que havia vencido aquela loteria.  

Mas o zagueiro-destino, traiçoeiramente, surgiu inesperado, derrubando o craque, o atleta, o moleque, o menino, o homem, o filho, o irmão, o amigo, o colega, interrompendo a sequência ao caminho do gol que ele tantas vezes encontrara, justamente na véspera da partida decisiva do time em que ele tantas vezes ajudou a erguer a taça.

Um cara que viveu do seu jeito, que escolheu viver sozinho, mas que surpreendentemente arrebanhou amigos que estiveram do seu lado até o fim. Que foram fiéis e leais a sua história, ao seu legado, e que aplaudiram de pé teu último lance nesse jogo da vida, quando a laje se pôs sobre aquele curto espaço em que fostes colocado e que para você, numa quadra, num campo de futebol ou de pelada, seria um latifúndio.     

Como os versos da música “Balada número 07”, de Moacir Franco, que abriu esta homenagem,  todos nós que tivemos oportunidade de te conhecer, de jogar, estudar, trabalhar com você, cantaremos, emocionados o refrão:

“Cadê você, cadê você, você passou,
O que era doce, o que não era se acabou,
Cadê você, cadê você, você passou,
No vídeo tape do sonho, a história gravou”.

Até um dia, amigo.

Obrigado por ter convivido com a gente.

 



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